quarta-feira, 17 de outubro de 2018

BRASIL: O PAÍS DEFORMADO PELA PEDAGOGIA COLONIAL


No recente artigo – Moinhos de Vento ou Reflexões sobre a Eleição de 7 de outubro de 2018 – referi-me ao triunfo do sistema financeiro internacional, a banca, em colocar temas irrelevantes para a discussão política nesta eleição.

Mas não aprofundei esta ação de mudar o foco e mesmo o entendimento das verdadeiras questões nacionais.
Denomino “pedagogia colonial” esta desinformação, entranhada no conhecimento e no imaginário de todos os brasileiros, ricos e pobres, populares ou da elite.

Aspectos da Pedagogia Colonial

O maior sociólogo brasileiro vivo e dos maiores de todos os tempos, Jessé Souza, nos ensina que dois crimes são cometidos a todo momento, nas ruas, na imprensa, no convívio dos brasileiros: o ódio ao pobre e a criminalização da igualdade.

O ódio ao pobre é resultado da escravidão que jamais deixou de existir no Brasil.

A academia, as esquerdas políticas e intelectuais, com as exceções costumeiras, nunca fizeram a leitura autônoma da sociedade brasileira, o que dirá do Estado Nacional.

João Fragoso, desta magnífica geração que está redescobrindo o Brasil Colonial, afirmou que a história daquela época, a que sempre tivemos, foi uma cópia dos relatos estrangeiros e das limitadas referências memorialistas.

O grande sociólogo contemporâneo, Pierre Bourdieu, construiu sua grande contribuição à ciência sociológica não pela ideologia mas pela pesquisa, pela investigação empírica.

O Brasil não é somente mal conhecido, ele é deformado pela pedagogia colonial. Esta que coloca a corrupção, por exemplo, como o grande problema brasileiro. Se assim fosse os Estados Unidos da América (EUA), onde tudo, literalmente tudo, é resolvido pela quantidade de dinheiro envolvida, não teria alcançado seu poder econômico e militar.

A grande inimiga do conhecimento, que se adquire pela emoção mais do que pela razão, é a mídia, a televisão que no Brasil é um quase monopólio da Rede Globo. O mal que esta exclusividade faz ao País é visto no atraso social, cultural e também econômico e tecnológico em que vivemos.
Procurarei discorrer sobre alguns aspectos desta forma de levar a pedagogia colonial aos lares de toda a Pátria Brasileira.

Classes em nossa sociedade

Os marxistas, em geral, colocam a questão econômica e social como resultado da luta de classes, única forma de superar as desigualdades. Creio ser uma visão um tanto simplificada de uma realidade muito mais rica e complexa. É do que tratarei, desvendar esta sociedade, com o inestimável auxílio de Jessé Souza.

A sociedade brasileira tem, considerando as rendas, conforme dados de 2016 do IBGE, três estamentos sociais: a classe dos 1%, a elite; as classes médias, 16% e os pobres, os que vivem com renda inferior ao salário mínimo, 83%.

O que mais diferencia as classes médias dos pobres não é, no entanto, o rendimento, é o acesso ao conhecimento, a reprodução de um tipo de julgamento, de conceitos e classificações. Este conjunto está esplendidamente descrito em “La Distinction: critique sociale du jugement”, de Pierre Bourdieu (Les Éditions de Minuit, 1979).

Como concluiu, com sabedoria, Jessé Souza, o que mais ameaçou e colocou a classe média contra a política de aumento de renda e de oportunidades para a classe pobre, projeto de Lula, foi a entrada destes na Universidade. A condição de absorver os conhecimentos que distinguiam pobres de ricos; muito mais do que a frequência aos shoppings e aeroportos.

Os pobres passariam a ter os recursos que os fariam entender a diferença do gosto bárbaro do gosto “puro”, como trata Bourdieu.

A classe média é heterogênea, mas seus membros, na grande maioria, tratam-se como capitães-do-mato, na defesa dos 1% e na opressão e desinformação dos 83%. São os juízes, os militares, os fiscais, os empregadores e os intelectuais, que dão, com suas palavras e ações, a garantia das pós-verdades, das farsas e fraudes que confundem a população.

O ódio ao pobre vem da escravidão racial. Diz o imenso pensador, pedagogo, antropólogo Darcy Ribeiro: “A luta mais árdua do negro africano e de seus descendentes brasileiros foi, ainda é, a conquista de um lugar e de um papel de participante legítimo na sociedade nacional. Nela se viu incorporado à força. Ajudou a construí-la e, nesse esforço, se desfez, mas, ao fim, só nela sabia viver, em função de sua total desafricanização”. E, ainda: “As atuais classes dominantes brasileiras, feitas de filhos e netos de antigos senhores de escravos, guardam, diante do negro, a mesma atitude de desprezo vil. Para seus pais, o negro escravo, o forro, bem como o mulato, eram mera força energética, como um saco de carvão, que desgastado era facilmente substituído por outro que se comprava. Para seus descendentes, o negro livre, o mulato e o branco pobre são também o que há de mais reles, pela preguiça, pela ignorância, pela criminalidade inatas e inelutáveis. Todos eles são tidos consensualmente como culpados de suas próprias desgraças, explicadas como características da raça e não como resultado da escravidão e da opressão. Essa visão deformada é assimilada também pelos mulatos e até pelos negros que conseguem ascender socialmente, os quais se somam ao contingente branco para discriminar o negro-massa. A nação brasileira, comandada por gente dessa mentalidade, nunca fez nada pela massa negra que a construíra. Negou-lhe a posse de qualquer pedaço de terra para viver e cultivar, de escolas em que pudesse educar seus filhos, de qualquer ordem de assistência. Só lhes deu, sobejamente, discriminação e repressão” (O povo brasileiro, Companhia das Letras, 1995).

Ataque midiático

Destruir a capacidade de refletir sobre si mesmo, seu futuro, é o objetivo colonial que a Globo coloca 24 horas no ar.

De acordo com Jessé Souza, o grande ataque midiático foi na criminalização da igualdade. Esta igualdade de acesso aos bens materiais, mais evidentes, mas, muito mais grave e profundo, na igualdade de se conhecer, se entender como pessoa e não um objeto de trabalho com a força, não com o cérebro.

Vem daí a necessidade de estar constantemente ofendendo, desconstruindo qualquer trabalho, qualquer criação de pobres, pretos e brancos, tão pobres que parecem pretos.

Haiti, de Caetano Veloso

Quando você for convidado pra subir no adro
Da fundação casa de Jorge Amado
Pra ver do alto a fila de soldados, quase todos pretos
Dando porrada na nuca de malandros pretos
De ladrões mulatos e outros quase brancos
Tratados como pretos
Só pra mostrar aos outros quase pretos
(E são quase todos pretos)
E aos quase brancos pobres como pretos
Como é que pretos, pobres e mulatos
E quase brancos quase pretos de tão pobres são tratados.
Jamais construiremos, com a Rede Globo impune e poderosa, uma Pátria Soberana, de cidadãos livres e conscientes, de si e dos outros.

O ódio puro, não a ideias, ideologias, a desvios de conduta, simples pretextos, o ódio é dirigido a pessoas: pretas, pobres, desvalidas.

Na Alemanha, o nazismo não começou contra os judeus, mas contra os deficientes físicos e mentais. É história. Pesquisem, averiguem.

Onde nos levará a mídia televisiva no País?

Qualquer resultado neste segundo turno será igual, se forem mantidos os privilégios da mídia televisiva e radiofônica, se não forem regulados os limites desta ditadura e de seu protetor, o judiciário.

O ódio ao Lula não se deve ao vermelho do PT, à corrupção em seu governo, à presença de pobres em supermercados, mas na abertura das universidades aos pobres e pretos, às cotas, à possibilidade de sair da influência da Globo. O que mantém o relativo poder dos capitães-do-mato do século XXI.




segunda-feira, 8 de outubro de 2018

Imprensa internacional repercute resultado das eleições no Brasil

O resultado das eleições no Brasil deste domingo (7) repercutiu em sites, jornais e emissoras de fora no país. Os veículos tentam analisar os fatores que contribuíram para que Jair Bolsonaro (PSL) e Fernando Haddad (PT) fossem para o segundo turno, no dia 28 de outubro.
Veja a repercussão na imprensa internacional:
No site do jornal americano, Bolsonaro aparece na primeira página, como o candidato que “vai para o segundo turno, depois de não ter vencido (em 1º turno)”. O “New York Times” afirma que os brasileiros se inclinam para o candidato, porque estão “fartos de corrupção e violência”, e que expressaram desgosto com a “política de costume”.
Segundo o jornal, “Bolsonaro surpreendeu o establishment político ao subir ao topo de um campo presidencial lotado, apesar de uma longa história de comentários ofensivos sobre mulheres, negros e gays”. A publicação afirma que os dois candidatos para o segundo turno “representam visões radicalmente diferentes para o Brasil, a quarta maior democracia do mundo, onde os esquerdistas conquistaram a presidência em todas as eleições desde 2002”.
O jornal mexicano “Excelsior” afirma que Bolsonaro conseguiu mais apoio do que o previsto nas pesquisas pré-eleitorais e que o país está dividido entre os apoiadores dos dois candidatos que foram para o segundo turno.
“O primeiro turno desenha um mapa geográfico eleitoral do Brasil muito dividido entre o nordeste, como campo da esquerda e de população de renda baixa, que votou pelo socialista, e o sul, sudeste e centro, as regiões mais ricas, marcadamente conservadores”, diz o texto.
O tema foi destaque na primeira página do site do “El Clarín”, que observa que Bolsonaro tem “ampla vantagem” sobre Haddad e que essa diferença representa uma tendência para o segundo turno. Segundo o jornal, a liderança de Bolsonaro era previsível e, com a diferença de votos em relação a Haddad, “é possível prever uma vitória do ex-militar no domingo 28”.
O jornal conta ainda sobre o alívio na campanha de Haddad pelo fato de Bolsonaro não ter vencido no primeiro turno.
A emissora britânica diz na primeira página de seu site que “o sucesso de Jair Bolsonaro e seu partido marca uma mudança sísmica na política do Brasil”. A BBC analisa o resultado da eleição legislativa, observando que o PSL de Bolsonaro era “insignificante” e que agora “está prestes a se tornar a maior força do Congresso”.
A emissora cita também a rejeição ao PT: “O político [Bolsonaro] e o PSL enfrentam uma onda de revolta crescente com o Partido dos Trabalhadores, que seus partidários culpam por uma recessão prolongada, aumento do crime violento e corrupção generalizada na maior economia da América do Sul”.
O jornal espanhol diz que “Jair Messias Bolsonaro, o defensor dos valores mais retrógados, esses que cada vez com mais força se destacam sem freios pelo mundo, ambiciona a presidência do país sul-americano”. De acordo com o “El País”, “apenas uma reviravolta radical, quimérica no 28 de outubro impedirá que a extrema-direita governe a partir de 1 de janeiro”.
O texto diz que agora os candidatos que perderam devem declarar seus apoios e que um silêncio “será interpretado como um apoio tático ao projeto do ultraconservador”.
A chamada do site do jornal italiano para a reportagem sobre o Brasil diz: “Jair Bolsonaro, o nostálgico da ditadura a um passo da vitória”. No texto, o “Corriere” afirma que o candidato do PSL esteve perto da vitória em primeiro turno e conquistou a maioria dos eleitores brasileiros com “uma nova política baseada nos algoritmos das redes sociais, um programa inexistente e nenhuma classe ou partido dominante por trás”.
O jornal francês afirma que o Brasil nunca esteve tão divido em uma eleição e atribui a liderança de Bolsonaro à “sua postura dura em relação à insegurança e porque sua carreira é livre de corrupção, enquanto o PT está envolvido em um dos maiores escândalos de corrupção descobertos na história do país”.
O “Le Monde” também observa que o candidato do PSL tem uma grande rejeição do eleitorado. “Muitas pessoas não acreditam na promessa de campanha do candidato de respeitar os ideais democráticos”, diz o texto.
O canal russo feito em inglês também observa que essas eleições são vistas como as mais polarizadas desde o fim do regime militar no Brasil. O RT noticia que haverá segundo turno, “depois de [Bolsonaro] quase conseguir 50% dos votos na primeira rodada”.
O canal chama o candidato do PSL de "Trump dos trópicos", numa comparação com o presidente americano. “Bolsonaro montou uma onda de sentimento anti-establishment no Brasil para registrar um crescimento sem precedentes no apoio popular, não diferente do que fez Donald Trump em 2016”, diz.
“New York Times” (EUA)
“Excelsior” (México)
“El Clarín” (Argentina)
BBC (Reino Unido)
“El País” (Espanha)
"Corriere Della Sera" (Itália)
"Le Monde" (França)
RT (Rússia)